(Foto: Gilson Abreu/AEN) |
O horizonte para a recomposição dos reservatórios que
abastecem a Região Metropolitana de Curitiba (RMC), que operam atualmente com
um terço da capacidade, não é muito animador. A estiagem que já dura um ano no
Paraná, com mais intensidade na região Leste (RMC e Litoral), não deve dar
trégua até a primavera. A previsão do Simepar é que ela se prolongue, pelo
menos, até as próximas chuvas de verão, entre dezembro e fevereiro do ano que
vem.
“Podemos esperar um resto de inverno seco, com poucos
eventos e chuvas menos intensas até o início da primavera. Mesmo que chova mais
na próxima estação do que agora, o volume ainda será insuficiente”, explica o
diretor-presidente do Simepar, Eduardo Alvim. “Esta situação preocupa porque
precisamos de pelo menos três meses de chuva dentro ou acima da média para
conseguir recompor os níveis dos mananciais”, diz.
Além disso, os paranaenses também precisam torcer desde já
para que o fenômeno La Ninã, que pode se formar no início do ano que vem, não
se concretize. O resfriamento das águas do Oceano Pacífico pode ter como
consequência um verão mais seco no Estado, justamente quando são esperadas as
chuvas mais intensas, que ajudariam os mananciais a recuperarem o nível normal
de vazão. “Se a estiagem se prolongar para o verão, as consequências serão
muito graves”, afirma Alvim.
Não é apenas o abastecimento de água que fica comprometido
com a falta de chuvas. A estiagem é ruim para o meio ambiente, aumenta o risco
de queimadas, reduz a qualidade do ar, causando vários problemas respiratórios
em um momento em que o mundo todo se preocupa com a Covid-19, e traz impactos
para a economia, afetando a agricultura, a produção industrial e o fornecimento
de energia.
Estiagem
Uma passada de olho no mapa do Simepar mostra uma variação de diferentes tons
de marrons, que medem a intensidade de estiagem no Estado. Trata-se do SPI,
sigla em inglês para o Índice Padronizado de Precipitação. Nas localidades em
que o tom é mais escuro – abrangendo parte das regiões Oeste, Central, Sul,
Centro-Sul, RMC e Litoral – a ocorrência é de estiagem extrema, a maior em 50
anos. Nas demais, o nível varia de estiagem leve (a pior dos últimos três
anos), para moderada (10 anos) a forte (20 anos)
Inverno
O inverno, que já é um período normalmente seco, tem sido ainda mais árido
neste ano. Com exceção de parte do Centro-Oeste e do Sudoeste, a média de
chuvas ficou o abaixo do normal em todo o Estado entre maio e julho.
Julho foi mês mais seco: em praticamente todo o Paraná,
choveu de 80% a 100% menos do que era esperado para o período. Na estação
meteorológica de Curitiba, por exemplo, o acumulado de chuvas foi de 26,4
milímetros em julho, contra 128,4 milímetros em junho, quando as precipitações
ficaram próximas à média.
Em nenhuma das estações do Simepar o acumulado ultrapassou
60,2 milímetros no mês passado. O menor índice foi registrado na estação de
Maringá, que chegou a apenas 8,6 milímetros.
Emergência
O Paraná está desde maio em situação de emergência hídrica, o que permite a
adoção de medidas de racionamento para equilibrar a distribuição de água. Desde
o início do ano, dez municípios também registraram ocorrências no sistema da
Coordenadoria Estadual da Defesa Civil por causa da estiagem. Foram eles:
Pinhais, Tijucas do Sul, Rio Negro, Iretama, Prudentópolis, Roncador, Nova
Tebas, Lidianópolis, Morretes e São João do Triunfo.
Abastecimento
A possibilidade que falte água para o abastecimento tem sido a maior
preocupação da Sanepar, que está tomando novas medidas para mitigar a falta
d’água. O nível médio das quatro barragens que abastecem a Região Metropolitana
de Curitiba está em 31,09%. A represa do Iraí opera com 11,72% da capacidade,
Passaúna com 34,17%, Piraquara I tem 17,21% do nível e Piraquara II 93,06%.
Por causa desta situação, a companhia implantou, em março um
rodízio no abastecimento, primeiramente na região Sul de Curitiba e em São José
dos Pinhais. Com o passar do tempo, a crise hídrica agravou as vazões de rios e
poços que abastecem a região, o que levou a Sanepar a ampliar o rodízio para
todas as regiões de Curitiba e Região Metropolitana.
“Acompanhando as chuvas que tivemos no último ano e a
previsão para os próximos meses, fica claro que estamos em uma estiagem
extremamente severa. Esta situação, combinada às necessidades por causa da
Covid-19, levou nossos reservatórios a níveis que nunca estiveram antes, estão
muito baixos”, afirma o diretor de Meio Ambiente e Ação Social da Sanepar,
Julio Gonchorosky.
“Com isso, as ações que estamos fazendo, como rodízio, busca
por captação alternativa, transposição de rios e a economia da população, estão
se mostrando insuficientes”, afirma. “Cabe a nós termos a responsabilidade de
tomar novas medidas, mesmo que sejam mais duras, para garantir o acesso à água
pela população futuramente. E é papel também de cada um em fazer um uso
racional da água, com zero desperdício”, ressalta.
Atualmente, cerca de 750 mil pessoas estão em rodízio todos
os dias. Como as medidas ainda são insuficientes, a Sanepar deve endurecer
ainda mais este sistema. No restante do Estado, o abastecimento tem se mantido
normal. Na Região Oeste, em Medianeira, há uma situação mais crítica, com
avaliações periódicas para definir se haverá ou não rodízio.
Queimadas
O grave acidente que aconteceu no domingo (2) em São José dos Pinhais
também acendeu o sinal de alerta para outra situação que é agravada pela
estiagem. O engavetamento que envolveu 22 veículos, matou oito pessoas e deixou
outras 22 feridas foi consequência da falta de visibilidade causada por uma
queimada na beira da BR-277, combinada à neblina.
De acordo com os dados do Sysbm, o sistema que contabiliza
os atendimentos do Corpo de Bombeiros do Paraná, já foram registrados neste ano
6.640 incêndios em vegetação em todo o Estado, 788 somente em julho e 384 nos
últimos 7 dias. No ano passado, o número de focos de queimadas chegou a 12.719,
uma média de quase 35 por dia.
O comandante-geral do Corpo de Bombeiros, coronel Samuel
Prestes, explica que praticamente todos esses incêndios são causados por ação
humana. “Por causa da estiagem, as nossas matas estão muito secas e, portanto,
muito vulneráveis às queimadas. Nós orientamos a população para que tenha
cuidado com o manejo do fogo, que evite queimar lixo, fazer queimadas para
limpeza de terrenos”, diz. “Com a vegetação seca, os incêndios tomam um volume
muito grande rapidamente, podendo atingir uma residência, uma indústria ou
causar perda de visibilidade, como na tragédia que aconteceu na BR-277”,
ressalta.
“Temos atendido muitas ocorrências por causa da estiagem,
sem contar que a crise hídrica também afeta a disponibilidade de água, o
principal insumo que usamos para apagar os incêndios”, ressalta o coronel
Prestes.
“Não temos como controlar as condições atmosféricas, mas o início
do fogo é feito pelo ser humano, que deve evitar e ter cuidado com o manejo.
Contamos com o apoio de toda a população, para que seja mais cautelosa e
cuidadosa no uso do fogo”, orienta.
Meio ambiente
A situação levou o Instituto de Água e Terra (IAT) a publicar uma portaria
que suspende por 30 dias a prática de queima controlada na cultura de
cana-de-açúcar. Isso porque as queimadas também são responsáveis pelo aumento
do chamado material particulado, que amplia a poluição atmosférica.
A gerente de Licenciamento Ambiental do IAT, Ivonete Chaves,
explica que a baixa umidade atmosférica, agravada pela falta de chuvas e pela
fumaça, aumenta a dispersão de partículas, trazendo problemas respiratórios
tantos para os humanos, como para os animais. “Nas cidades, a fuligem das
fábricas e dos carros fica mais presente no ar. No meio rural, há a questão das
queimadas e da poeira das estradas não pavimentadas, o que agrava muito os
problemas respiratórios. As pessoas ficam com a boca, olhos e nariz secos, há dificuldade
para respirar”, diz.
Outro problema diz respeitos aos rios e lagos, que estão com
menor vazão. “A falta de água nos corpos hídricos aumenta a concentração de
poluentes, como se o rio não tivesse a capacidade de dissolver essas
partículas. É um problema sério que causa falta de oxigênio na água, aumentando
a mortalidade dos peixes e trazendo um custo maior para o tratamento
sanitário”, explica Ivonete.
Energia
Outro setor que é afetado pela estiagem é o de energia, já que a falta de
chuvas interfere no armazenamento dos reservatórios das hidrelétricas. Na
região Sul do Estado, a Copel registrou o pior nível dos últimos 20 anos nos
lagos de suas usinas. Porém, mesmo com a situação preocupante dos
reservatórios, não há risco de falta de energia, porque o suprimento para a
região Sul do Brasil é complementado com energia proveniente do Sudeste.
A existência do Sistema Interligado Nacional e a capacidade
de intercâmbio energético entre as regiões, através de redes de transmissão
robustas, garantem o atendimento da demanda nesse período crítico, explica o
gerente do Centro de Operações de Geração e Transmissão da Copel, Ricardo
Rodrigues de Almeida.
O Operador Nacional do Sistema (ONS), responsável pelo
planejamento energético e controle do sistema, adotou, no início do ano, uma
política de redução da geração de energia nas hidrelétricas do subsistema Sul e
aumentou o intercâmbio da região Sudeste com o Sul. “O sistema tem uma
dependência muito grande da geração hidráulica. Com a estiagem, esta operação tem
sido bastante prejudicada por causa da baixa disponibilidade dos
reservatórios”, explica Almeida. “Nossa energia vem sido suprida, na maior
parte dos dias, pelo que é produzido nos outros estados”, diz.
Até a sexta-feira (07), os dados disponibilizados pela Copel
na página de monitoramento hidrológico mostravam que o reservatório de Foz do
Areia estava com 42% do volume útil e o de Salto Santiago com 38%. Ambos estão
localizados na bacia do Rio Iguaçu e representam, juntos, 47% de todo o
subsistema.
A situação também é crítica em outras bacias, como a do
Tibagi. O reservatório da Usina Governador Jayme Canet Junior (Mauá), que
também cumpre uma função de regularização no Tibagi, está em 35%.
A Copel disponibiliza ao público as medições coletadas nos
postos de monitoramento hidrológico, que geram dados em tempo real da vazão dos
rios onde tem usinas. Esses dados são usados para subsidiar o trabalho das
equipes de operação e podem ser acessados na página www.copel.com/monitoramento
*AEN
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