A Queda: breves considerações sobre o processo de Impeachment

(Foto: Lula Marques / Fotos Públicas)

Após os escândalos envolvendo a compra da vacina Covaxin, novamente, volta-se a falar de um processo de impeachment contra o Presidente Jair Bolsonaro. Entretanto, desta vez, as conversas vêm acompanhadas de um superpedido, que listou 23 crimes de responsabilidade e uniu figuras da esquerda, como Gleise Hoffmann (PT-PR) e Alessandro Molon (PSB-RJ), e antigos aliados como Joice Hasselmann (PSL-SP) e Kim Kataguiri (DEM-SP). Basicamente, o impeachment é um processo que visa julgar um agente público por crimes de responsabilidade. Trocando em miúdos para a situação atual: é como um mecanismo de “freio” que o Congresso tem para evitar que o Presidente passe do limite. Entretanto, esse “freio” não é tão simples de ser “apertado”. Para que um chefe do executivo sofra um impeachment é necessário que uma conjunção de fatores ocorra, sendo eles regimentais e estruturantes. Os fatores regimentais, estão atrelados ao regimento interno da Câmara, as leis e questões formais. Os fatores estruturantes, estão relacionados a estrutura do governo frente aos desafios de um mandato. Deixando um pouco de lado os aspectos regimentais, é necessário fazer algumas considerações sobre os fatores estruturantes.

Desde a redemocratização, vários Presidentes enfrentaram pedidos de impeachment, porém nem todos tiveram o processo instaurado. Fernando Henrique Cardoso, durante seu segundo mandato, acumulou pedidos de impeachment. Luís Inácio Lula da Silva, por sua vez, passou por uma crise enorme com o mensalão, que quase culminou em um processo de impeachment, todavia Lula contornou a situação. Já Michel Temer, passou por uma situação mais apertada, chegando ao ponto do processo ser colocado em votação, porém, saiu vitorioso. Estes Presidentes tinham um ou mais fatores estruturantes os respaldando, como: economia estável, boa relação com o congresso e apoio popular. Porém, o mesmo não pode ser dito de Collor e Dilma.

Em 1989, quando foi eleito, Fernando Collor de Mello ascende ao poder de forma cataclismática. O então “caçador de marajás”, chegou ao poder com um discurso que lembra um certo presidente brasileiro (e não estou falando de Jânio Quadros). Porém, após a eleição, o ex-presidente não conseguiu atingir seus objetivos: a inflação continuou gigantesca, o que limitava a ação do governo em diversos setores; o poder de compra era extremamente baixo e a inadimplência era alta; a relação com o congresso era extremamente beligerante e, para piorar a situação, veio um grande escândalo de corrupção. A conjunção destes fatores, levou Collor à queda. Já a ex-Ministra da Casa Civil, Dilma Rousseff, foi reeleita acumulando problemas. O PT estava no poder há vários anos e o desgaste com a população foi inevitável. Os vários escândalos de corrupção, a crise econômica e o relacionamento difícil com o Congresso, foram fatores que causaram uma “tempestade perfeita”, que oportunizou um impeachment. Por mais que não tivesse seu nome envolvido em algum grave escândalo, como Collor, Dilma também fez uma conjunção de fatores que a levou à queda.

No atual momento, Bolsonaro passa por uma situação que lembra, e muito, o que já ocorreu no passado: um escândalo de corrupção o envolvendo de forma direta; um enxugamento do apoio popular, rejeição crescente ao governo; relação difícil e custosa com o Congresso Nacional, acumulando favores ao centrão, que costuma cobrar bem caro e; crise econômica, com inflação crescendo e o desemprego aumentando. O cenário parece oportuno para um impeachment, porém, tem um outro ponto fundamental para fechar a equação: o vice. Nos processos anteriores os vices, Itamar Franco e Michel Temer, estiveram diretamente ligados a construção de um novo governo, articulando e costurando acordos que deram suporte para o Brasil pós-impeachment. Este movimento, até então, não é visto no vice de Bolsonaro, o General Hamilton Mourão. Mourão, que pouco se relaciona com o Congresso, destoa fortemente dos antigos vices: Itamar Franco, quando tornou-se Vice-presidente da República, já havia sido Senador por 2 vezes, Prefeito e era um nome conhecido e respeitado entre os políticos da época. Já Michel Temer, havia sido Presidente da Câmara por 3 vezes, nos Governos de FHC e de Lula. Ambos tinham experiência e influência dentro do meio político. Além disso, cabe ressaltar que ambos eram figuras respeitadas no PMDB/MDB, partido de enorme relevância no Congresso. O General, por sua vez, não tem nada disso: nunca foi político e não tem um partido relevante como sua base. Este fator, sem dúvidas, é um dos grandes pontos-chave para entender o porquê de Jair Messias não ter caído ainda: se Bolsonaro sai, o que será do Brasil com Mourão? Haverá um novo governo ou seguirá do mesmo jeito? Estes questionamentos são importantes, pois sem um Presidente é preciso que alguém governe, porém este alguém está disposto a isso?

A verdade é que existe uma tempestade em formação. A conjunção de fatores está acontecendo e, em um dado momento, não será mais possível segurar. Mesmo recebendo alto, o Centrão é pragmático e não afunda com o barco de ninguém. O vice, aparentemente, tem certas divergências com o Capitão, porém ainda não acordou (ou não quis acordar). O tempo dirá se essa tempestade trará a bonança ou o caos.

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